segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

DO PENSAMENTO COMO UM EXERCÍCIO DE AUTO ESTIMA.

Cassiano Ribeiro Santos


Filho de um militar e uma poetisa, durante a adolescência, hesitou muito entre qual vocação seguir. Acabou por seguir o exemplo do seu pai e se alistou no Exército Francês. Mandado para as trincheiras durante a primeira guerra mundial. recebeu um tiro na coluna que lhe fez ficar paralítico pelo resto da vida. Esperado seria então que ele lamentasse a vida e, principalmente, o fatídico acidente de guerra; mas Joe Bousquet era de uma cepa distinta dos homens comuns. Decidiu, se é que podemos falar assim, seguir a carreira da sua mãe e se tornou um poeta fabuloso! Em suas reflexões sobre seu trágico destino, costumava dizer (palavras minhas):
_ Sou um poeta Surrealista. Minha matéria de trabalho é a imaginação. Para imaginar, um homem precisa ficar imóvel, a mínima ação física agita a alma imaginativa e estremece as imagens, como um pássaro na superfície de um lago onde o céu se reflete. Que situação mais adequada para um homem imaginar senão a inteira imobilidade em que me encontro? Sou um privilegiado! Essa bala que me pôs sobre um leito foi o instrumento de um destino glorioso. Eu nasci para encarnar esse tiro que já me esperava!
Muito mais do que resignação, Joe Bousquet, com tal pensamento, emprestou nobreza e brilho a um episódio absolutamente lamentável e ignóbil (qual homem não lamentaria um tiro na coluna?). Ao agir assim, ele transformou o acontecimento, de sórdido, em admirável, emprestou brilho ao que não tinha. Esse é o verdadeiro sentido do estoicismo, não resignar, mas ser digno do que lhe acontece. Emprestar à vida algo que só nossa alma e coração possui: beleza, ESPLENDOR! Seu exemplo de vida brilha muito acima dos belos poemas que escreveu, e no panteão dos poetas da humanidade a luz do seu AMOR FATI, sua contra-efetuação do acontecimento, sua CONFATALIA, como os Estoicos chamavam essa atitude de ser digno do que nos acontece, há de brilhar como uma estrela que explode e inunda o céu de luz. Sua postura afirmativa da vida foi uma supernova cujo esplendor muito em breve irá nos iluminar! 

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

No Cinema Com Platão

Cassiano Ribeiro Santos

Muito sintomático que, no seu livro A República, obra da velhice e considerada, junto com As Leis, o seu canto de cisne, Platão em momento nenhum trabalha com uma das suas mais originais e impactantes ferramentas conceituais: a Teoria da Reminiscência. Praticamente não há uma única alusão à essa via do conhecimento tão celebrada nas obras anteriores. A maioria dos comentadores falam que Platão se tornou um cético no final da sua vida, depositando na teoria do estado ideal todas as suas esperanças de um mundo melhor, a paideia ocupando o lugar da mística recordação dos arquétipos um dia vislumbrados por nossa alma. A verdade, porém, parece-nos ser outra: nessa obra, o filósofo nos apresenta a sua famosa Alegoria da Caverna. Nesse mito de soberania gnóstica, vemos os homens condenados à ignorância e às opiniões grosseiras sobre a realidade última das coisas, conhecendo apenas as sombras projetadas no interior da caverna. Para maior convicção do leitor, a teoria da reminiscência deveria ser eliminada, pois seria como um furo na lona, deixando entrar uma réstia de luz verdadeira, na medida em que estes prisioneiros poderiam acessar o conhecimento via este artifício espiritual mesmo presos e algemados no interior da caverna, não precisando assim romper com as formas de tirania que os aprisionavam, saindo para a luz natural do sol da Verdade lá fora (como era a proposta do vetusto filósofo). Feito Menelau sacrificando Ifigênia, Patão sacrificou um de seus mais diletos filhos, a Teoria da Reminiscência, para dar convicção e verossimilhança ao seu mito! Colocou a Eikasia, a fantasmagoria imaginária do mito acima do Logos, confundindo os leitores e fazendo o inverso do que pregava, enterrando mais ainda os leitores no fundo da caverna onde impera a ilusão da arte e dos mitos! Era um artista, acima de tudo. Um feiticeiro. Um Próspero dissimulado que, na velhice, finge ter jogado fora a varinha mágica e fica com ela sob as vestes brincando com Ariel e Caliban! Nietzsche foi um dos primeiros a perceber essa irredutível alma de artista do grego genial e enlouqueceu de tanta inveja! 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Lembranças

"Algumas pessoas que passaram pela nossa vida, por mais que a gente lute contra, que a gente se esforce em não lembra-las, elas continuarão sendo sempre inesquecíveis...continuarão sempre presentes na história da nossa vida, nos nossos momentos alegres, por que são neles que lembramos da alegria de quando essas pessoas se faziam presentes ,nos nossos momentos de solidão, por que são nesses momentos que, as lembranças invadem o nosso coração, a nossa alma, e sentimos a força que tem dentro de nós, a palavra saudade."



       Colagem e acrílico sobre cartolina, legendada com versos. Ambos feitos após ver uma exposição de águas-Forte do Francisco de Goya no Museu de Arte Moderna, em Salvador, no distante ano de 1999! Detalhe é que, na época, eu hesitava muito entre ser escritor ou pintor e a colagem representou bem esse meu dilema de então! Na dúvida, acabei me tornando os dois: um pintor bissexto e um escritor canhestro! Lasquei minha alma em duas bandas! 

O Imortal



Quando você possui um pesadelo recorrente, quase toda noite reencenando-o nos difusos átrios do sonhar, isso é tipicamente um sintoma, um trauma não resolvido e latente que retorna como uma chave errada que tenta inútil e insistentemente abrir uma porta! Mas conheço uma situação análoga em que você tem um sonho e, quinze anos depois, torna a ter exatamente o mesmo sonho do qual voce quase não se lembrava mais: sonhar e recordar, como se em uma onírica e inconsciente anamnese platoniciana; então, outros quinze anos e você volta a ter o mesmíssimo sonho.... Isso significa, independente do conteúdo e do trauma correlato, que parte de seu espírito trabalha em ritmos e diapasões que apontam para uma duração muito maior do que apenas 70, 90 anos de existência, assim como, pelo intervalo cada vez maior entre os relâmpagos e trovões, podemos concluir que a uma tempestade se perde nas montanhas, resolvida em vapores e murmurando seu desgosto! Este arrazoado é, para mim e para os que experimentam esse tipo de intermitência e repetição, uma espécie de prova psicológica da eternidade da minha alma! Para terror e desespero dos meus inimigos!


Cassiano Ribeiro Santos

Genios Taurinos

 

Quando Balzac já possuía quase quarenta anos, recebeu uma carta anônima de uma admiradora que assinava "A Estrangeira". Imediatamente se enamorou apaixonadamente dela e lha assediou durante um ano, sem conhecer sequer o seu nome, com seus arrebatamentos de amor onde derramava nas cartas toda a genial loucura do seu coração.Logo o conto de fadas se tornou realidade; A estrangeira veio da Rússia e lhe propôs um encontro em uma cidade na Suíça. Balzac teve que fazer o possível e o impossível para ganhar em dez dias cem luízes de ouro, escrevendo livros a todo vapor, para poder viajar. Se encontraram em Neuchâtel e ela se lhe entregou totalmente. Essa mulher era Eva Von Hanska, a esposa de um riquíssimo conde da Ucrânia, que já tivera vários filhos mas ainda sendo uma jovem beldade rubensiana com cabelos negros e uma boca sensual e cruel. Os amantes juraram casar-se quando o conde estivesse morto. Balzac estava fora de si; Já se via como senhor das possessões ucranianas, em seu quarto de trabalho fixou um quadro com a visão do castelo dos Hanski, em Wierzchownia. Ao mesmo tempo queria tornar-se rico, famoso e poderoso para poder converter sua Eva na "dona de Paris". Lhe saudava com a expressão "Ave, Eva!" e lhe escrevia cartas intermináveis, rebuscadas de banal patetismo nas quais punha a sua amada pelos céus, céus estes totalmente ofuscados. " Te amo como se ama a Deus, como se ama ao destino", dizia em uma de suas litanias embriagadas.
O que se seguiu foi um verdadeiro martírio. Teve que fazer gigantescos esforços econômicos para poder enfrentar a situação. Um segundo encontro em Genebra ele pagou com um serviço que lhe comprometia entregar doze livros, a maioria ainda não escritos. Mais tarde não conseguia juntar dinheiro para viajar até Eva, apesar de trabalhar como escravo, por estar nas mãos de seus credores e por seguir contraindo dívidas com suas aquisições luxuosas em vistas do casamento combinado. Frequentemente se encontrava na miséria enquanto sua amada, sem compreender a sua situação, continuava em sua vida feudal e lhe torturava com seus caprichos e sua altivez. Depois de alguns dias maravilhosos em Viena, ficou sem ver Eva durante sete longos anos. Após dez anos desta "vida conjugal espiritual", morreu o conde Hanski, porém Eva seguiu protelando cumprimento de sua promessa com diferentes pretextos. Balzac teve que ter paciência por mais sete anos antes de poder conduzi-la como sua esposa a sua faustosa vivenda parisiense, em maio de 1850. Poucas semanas depois, morreu. A quimera havia cumprido sua missão.

In Tragische Literaturgeschichte (História Trágica da Literatura), Walter Muschg.

Nota do Tradutor: Os historiadores e críticos são unânimes em comentar esse episódio na vida do Balzac como uma profunda ironia do destino, uma patuscada romântica. Nenhum deles consegue perceber que Balzac morrera de amor ao, finalmente, após dezessete anos de espera, morar com a sua amada sob o mesmo teto! Prova disso, para mim, é que ele escrevera seu mais esotérico romance, Seraphita, nos períodos em que com ela se encontrava! Nesse mágico romance vemos um ser pleno e iluminado, de sugestivo nome angelical, esbanjando bonomia e e felicidade por ser um ser composto pelos dois sexos unidos na mesma alma. Um mítico andrógino tal como Aristófenes, em O Banquete. Um ser que não precisava mais de nenhum contato carnal com ninguém por estar absolutamente pleno de amor. Seráphita, publico aqui em primeira mão para registro dos acadêmicos, era um secreto relato autobiográfico, era O CASAL, tal como Zelda e Fitzgerald anos mais tarde e tantos outros intensos e abençoados casais que na terra realizam a promessa divina de serem uma única alma quando nas suaves noites celestiais!

₢ Tradução do alemão e notas Cassiano Ribeiro Santos
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