quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Sonhos Divinos

  Cassiano Ribeiro Santos
   sexta, 22 de Janeiro de 2010 às 10:18 ·

Voltei sonhando à casa da minha infância e contemplei pela janela do meu quarto o quintal, onde eu brincava de ser adulto e as tardes brincavam de serem eternas (se um dia descobrirem um parentesco entre os sonhos e a eternidade, entre a imaginação criadora e a alma do mundo, como pensava Avicenna, recordaremos, do nosso passado, bem mais os sonhos que aqui tivemos do que da vida que realmente vivemos). Voltando a fita, eu contemplava o quintal agora gigantesco, pois, para ali hospedar os sentimentos da infância, a percepção da época em que os lugares eram enormes fora ativada com certa dose de exagero. Era grande também a desolação por não haver ninguém ali além de mim a admirar, feito um Adão pecador, um paraíso perdido e sempiterno. Para meu grande estupor, ao fitar o céu, vi as nuvens caprichosas, à luz trágica do poente, encenarem episódios da minha infância que julguei extraviados nas curvas da memória: em uma longa faixas de cirros dilacerados pelo vento havia uma criança erguendo pelas patas dianteiras um animado cãozinho – era eu e duque, meu cachorro que, em lágrimas, um dia enterrei; gordos nimbos no horizonte tinham a forma de um menino sobre um tonel a rolar em mirabolantes piruetas e uma nuvem escura no meio do céu, projetando sua sombra no quintal, era o arquétipo da minha cerejeira em cujos galhos meus dedos inocentes disputavam com o vento uma pipa ali presa. O movimento das nuvens - presto andante - surpreendia-me por não desfazer as imagens, mas evoluir-lhas com a graça de um teatro japonês. Ver o trailer da minha infância comezinha, projetada nas lâminas hiperbóreas do céu, deu-me a embriagante sensação de DEUS estar por trás deste sonho, fazendo o back-up da memória e apascentando nos brancos rebanhos do céu a minh’alma de nefelibata.

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